quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O INCESTO: A DESTRUIÇÃO FAMILIAR
Mariceli Porto Fernandes
Epecialização em Filosofia e Psicanálise
Universidade Aberta do Brasil
Universidade Federal do Espirito Santo

Resumo
O presente artigo trata de um fato difícil de ser aceito pela sociedade, que leva a destruição de uma família. O incesto um ato intimamente “Proibido”, no qual encontramos em todas as suas definições e que ainda é para nós um assunto que escapa ao esclarecimento.
Ao tentar desvendar a formação social ou comportamental do homem e compreender o seu histórico-cultural, nos deparamos com uma realidade fisiológica, cultural ou psíquica que expressam as relações e fatos que os envolve numa situação que consideramos “animal”. Para Freud a proibição do incesto é vista como neurose ou problema psíquico, enquanto para Levi-Strauss como um problema social.
Palavras-chave: incesto, família, cultura, comportamento.

Abstract
This article deals with a difficult fact to be accepted by society, which leads to destruction of a family. Incest an act intimately "Forbidden", in which we find in all your settings and still is for us a matter that escapes explanation.
When trying to unravel the social or behavioral training of men and understand their historical and cultural reality faced with a physiological, psychological or cultural relations and expressing the facts that involves a situation that we consider "animal". For Freud the prohibition of incest is seen as neurosis or psychological problem, while for Levi-Strauss as a social problem.

Keywords: incest, family, culture, behavior.

Introdução
Freud e Levi-Strauss construíram suas análises a respeito da proibição do incesto a partir de teorias distintas e diferenciadas e desenvolveram suas teses também de forma diferenciada para explicar o que leva o homem a esse tipo de comportamento, que não será aqui comparada.
Num primeiro momento deste trabalho cito a contribuição de Freud, em seguida a contribuição de Strauss e para concluir realizarei uma reflexão referente à proibição do incesto e casos ocorridos na sociedade atual.
A proibição do incesto contém em si elementos que nos leva ao entendimento sobre o desenvolvimento cultural do homem de todos os tempos e principalmente do homem moderno.
Freud e Levi-Strauss buscaram as raízes da formação social do homem para tentar compreender o seu comportamento. Strauss analisa a proibição do incesto no modo em que o homem relaciona-se com o outro sexo, e como que “instintivamente” cria elementos de ética, moral e julgamento para quem não cumpre a regra. Freud também de maneira semelhante recorre à proibição do incesto, e busca através de seus estudos e analises compreender o inconsciente humano e suas neuroses, para entender os seus desejos.

1- O Olhar de Freud e o Horror ao Incesto
Em Totem e Tabu, Freud compara os ritos dos povos primitivos fazendo uma conexão entre a cultura e psicanálise, constatando que o totenismo não diverge dos costumes da nossa sociedade atual.
O totem define uma consangüinidade e a proibição ante o incesto entre membros do mesmo clã, que é fundamental para a preservação de toda a comunidade, assim como nós defendemos o incesto em nossa família, e nos escandalizamos quando lemos ou vemos reportagens a este respeito.
Freud pesquisa os povos aborígines australianos, que se mostram rigorosos e interceptores nas relações sexuais incestuosas, com regras e normas estabelecidas através do sistema totêmico, dividindo a sociedade em clãs que tem cada um o seu totem.
“esses selvagens têm um horror excepcional intenso ao incesto, ou são sensíveis ao assunto num grau fora do comum, e que aliam isso a uma peculiaridade que permanece obscura para nós: a de substituir o parentesco consangüíneo real pelo parentesco totêmico”. (p. 25)
Assim esse totem representado por um animal que pode ser comível e inofensivo, ou perigoso e temido, raramente representado por uma planta ou fenômeno natural como a chuva ou água, que Freud define como tendo dois sentidos contraditórios: por um lado “sagrado” e por outro “proibido”, com regras, normas e leis do totem que devem ser respeitadas e cumpridas e transmitidas hereditariamente por linhagem paternal ou maternal. Essa proibição do incesto não se da de forma automática, ela é vigiada por toda a tribo, pois essa proibição está ligada ao desejo de cometê-la, e aquele que desobedece torna-se um perigo, ameaça para toda a tribo e pode ser levada a morte.
Para manter a proibição, o homem, no seu desenvolvimento histórico-cultural cria tabus para expressar o que é sagrado, perigoso, proibido ou impuro. O tabu é uma proibição primeva, que impõe e é dirigida contra os anseios e desejos que estão sujeitos os homens.
Partindo desta analise, Freud defende a tese de que os “selvagens” tem mais escrúpulos do que nós nesta questão, talvez pelo fato de se acharem mais sujeitos ás tentações e daí precisarem dessa proteção.

2 - Levi-Strauss e o Incesto
Para Strauss o homem é formado por dimensões distintas, que apresentam reações internas e externas de acordo coma sua natureza e situação.
Strauss em sua tese encontra o sentido da proibição do incesto e o seu significado na construção cultural do homem, e estabelece limites e possibilidades em suas relações, a proibição do incesto ao seu olhar é social, imposta por normas e atitudes, e expressam o grau máximo da natureza animal do homem.
O incesto para ele é um fenômeno social que permite um estudo das relações biológicas e sociais do homem e a sua proibição não pertence nem a um nem a outro.
Para Levi-Strauss, assim como para Freud a proibição do incesto é um fenômeno sócio-cultural de caráter universal, que gera nas mais diversas culturas: comportamentos, regras, leis, moral e ética na formação social de cada povo, e o Tabu é para o homem a expressão de como ele cria um conjunto de meios, estratégias e mecanismos para lidar com a sua relação com o meio ambiente.
E partindo daí Levi-Strauss faz um estudo sobre o problema do incesto mostrando como o homem constrói, desde a sociedade primitiva, mecanismos para impedir relações que na consciência humana não são coerentes com a sua própria razão.

3- O Incesto no Mundo Contemporâneo
A proibição do incesto é sem dúvida um fenômeno universal, não explicável nem tão pouco aceitável. Sabemos que na nossa sociedade existem normas que proíbem o casamento entre pessoas que tem um determinado grau de parentesco, e esta sociedade ainda têm dificuldades em aceitar e lidar com o fato de uma família ser desestruturada ou destruída, no ambiente que para nós é configurado o mais seguro. Devemos ressaltar que a proibição do incesto é representada por mitos, religiões e códigos, é uma regra universal que em nosso Código Civil não é explicada, é considerada crime no nosso Código Penal (1940), Título VI Dos Crimes Contra os Costumes, também representada em nossa Constituição Federal (1988) através da Lei n 11.340, de 7-8-2006 (Lei que Coíbe a Violência Domiciliar Contra a Mulher), Cap. VII Da Família, Da Criança, Do Adolescente e Do Idoso, Art. 226. Que diz “A Família é à base da sociedade e que o Estado deve criar meios para coibir a violência intrafamiliar”.
Segundo Levi-Strauss a proibição do casamento entre parentes próximos pode ter um campo de aplicação variável, mas o desejo e as relações sexuais entre eles continuam presente em qualquer grupo, Segundo Freud, o desejo inconsciente e incestuoso pode estar presente em todos os indivíduos, assim como em Édipo e Electra, e suas teorias têm sido utilizadas para explicar a finalidade desta proibição e podem ser apresentadas nas formas: biológicas, sociais e psicológicas.
Pensando dessa forma, vemos que a teoria biológica analisa o incesto e os malefícios que o ato pode trazer aos descendentes pelo cruzamento de genes semelhantes, genes recessivos, contudo se essa teoria fosse biologicamente respeitada ou aceita não precisaria ser proibida por lei social, com isso vemos que a questão passa do aspecto biológico para o sócio-cultural.
A teoria social prioriza a importância do cruzamento de indivíduos geneticamente diferentes, possibilitando o desenvolvimento do individuo e da família permitindo a diferenciação e a função simbólica de cada um (pai, mãe e irmãos), já a teoria psicológica coloca o incesto como um problema mental, neuroses, problemas psicológico mal resolvido. Nessa linha de reflexão vemos que mesmo causando repulsa e sendo raras as relações incestuosas entre pais e filhos, entre irmão ou entre outros graus de parentesco o incesto é real, e ainda não são tratados como questão de saúde pública, nem são levados a tribunais de júri, muito menos são vistos como uma preocupação educacional é tratada como mais um caso raro ocorrido. No contexto atual vimos recentemente em reportagem sobre o pai maranhense, que teve sete filhos com a própria filha, um pescador que vivia em condições precárias, isolado, sem acesso a educação, o que não justifica o ato, mas colaborou segundo psiquiatras para o abuso do pai com a filha.
Assim também como o caso do engenheiro austríaco que também abusou sexualmente de sua filha e a manteve em cárcere privado, tendo sete filhos com ela, apesar de serem pessoas com níveis sociais, culturais e sócio econômico diferentes, causando horror á sociedades mundiais, talvez não imaginadas por eles, mas causando horror e repulsa, pois a figura do pai é para todos de proteção e não domínio e abuso, e mesmo sabendo que o pai maranhense tinha condições precárias e vivia em isolamento, esse argumento não justifica o que ele fez, mesmo porque nem sempre a sua vida foi isolada.
No entanto em algumas regiões do interior do Brasil é costume os homens iniciarem a vida sexual de suas filhas, com a idéia de que o pai tem mais experiência e conhecimento de mundo. Para exemplificar em algumas regiões interioranas do Tocantins, há relatos de meninas que foram abusadas pelos pais, porque lá é considerada “obrigação do pai”, iniciar sexualmente suas filhas, trazendo a essas meninas diversas conseqüências como: distúrbio emocional, social e gravidez precoce e indesejada, e sentem-se impotentes, não reagindo contra o próprio pai, figura de respeito e obediência, surgindo daí a lenda dos Botos, para justificar a sua gravidez e tirar a culpa do pai.
O incesto apesar de muitas vezes ficar encoberto, sem repercussão nacional ou mundial, continuará sendo um caso absurdo e moralmente condenável, que ainda acontece em muitas famílias da nossa sociedade e até em nossa própria, porque o casamento ou as relações entre primos cruzados que é o tipo de incesto que mais acontece em nosso país não atinge a esta proibição aqui referida, e acaba ficando apenas na consciência dos homens e como segredo bem guardado pela família, para que a sua destruição e vergonha não sejam ainda maiores.



Considerações Finais

Podemos dizer que Freud em seu ensaio mostra um problema atual, que muitas vezes encarado como divertido e inocente, cada vez mais presente em nossa sociedade que pode levar uma família a destruição, por pessoas que não conseguem controlar seus instintos ou interromper pensamentos que podem levar ao incesto.
Mesmo procurando entender que a questão do incesto pode ser biológica, antropológica, psíquica ou provavelmente uma mistura de tudo isso, que acontecem raramente (ou raramente é divulgada) ainda nos causa repulsa e vai continuar sendo para a nossa sociedade condenável.
No mundo contemporâneo, a proibição do incesto mesmo não sendo punido criminalmente e que permita casamento entre tio/tia, sobrinho/sobrinha, primo/prima, continuará sendo para todos incesto.

Referências Bibliográficas

SAFATLE, Vladimir, (2010) Freud como teórico da modernidade bloqueada, Universidade Aberta do Brasil, Universidade do Espírito Santo.

FREUD, S. (1913) Totem e Tabu. In: FREUD, S. Obras psicológicas completas. Rio de Janeiro, Imago, 1980. v. 7.

CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, 16ª Edição, Editora Rideel.

VADE MECUN RT, Editora Revista dos Tribunais.

SILVA, Gastão Pereira da, Para Compreender Freud, Editora Itatiaia Limitada.

O PENSAMENTO VIVO DE FREUD, Editora Ilustrada, 1984.

PT. WIKIPEDIA.ORG/wiki/Incesto

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

RESILIÊNCIA SOCIAL NA MODERNIDADE BLOQUEADA

Elizabete Ribeiro da Silva Oaski[1]

Tutora: Adriana Paula[2]

Universidade Federal do Espírito Santo

Especialização em Psicologia e Psicanálise

elizabete.r.oaski@hotmail.com

adrianinhapaula@hotmail.com

RESUMO

Esse artigo trata da resiliência social dos indivíduos frente aos fatores geradores de tensões e exploração dos menos favorecidos na sociedade pós-moderna em que se encontram inseridos. Aponta a capacidade humana de superar crises e adversidades relacionadas à tolerância da corrupção, da negação dos direitos constituídos, dentre outros. Aborda o conceito de resiliência associando-o à Psicologia, focando o indivíduo e suas relações em contexto familiar e social. A partir daí, traça um paralelo entre essas ideias e a Teoria da Modernidade Bloqueada, com ênfase no desamparo do indivíduo, buscando, assim, com base na visão de Freud, uma explicação para a aceitação e comodismo mediante mazelas políticas que acabam repercutindo, invariavelmente, no social.

Palavras-Chave: Resiliência, sociedade pós-moderna, desamparo, exploração, tolerância.

INTRODUÇÃO

Nesta sociedade da informação e da comunicação em que vivemos, urge uma reflexão acerca das relações sociopolíticas do cidadão do século XXI a fim de compreendermos as tendências do mundo moderno, bem como, a atuação dos indivíduos nas esferas políticas, econômicas e sociais do país, focando a busca de emancipação e superação dos fatores geradores da desigualdade e exclusão social.

Esse artigo visa uma sucinta descrição da resiliência do indivíduo e sua relação com os conceitos de dependência e desamparo abordados por Freud na Teoria da Modernidade Bloqueada.

O tema em questão traz à tona algumas questões relevantes sobre a sociedade e seus governantes, elucidando a tolerância do cidadão frente aos descasos e explorações ocorridos no país e a aceitação dos direitos confiscados.

Essa pesquisa foi estruturada no intuito de abordar os assuntos descritos acima, suscitando melhor compreensão dessa realidade social.

1 - CONCEITOS DE RESILIÊNCIA

Para definir o significado do termo resiliência que vem sendo utilizado há muito pela Física (Silva Júnior, 1972) afirma que a resiliência corresponde à capacidade máxima do material em suportar determinada deformação, sem, no entanto, ser danificado de forma permanente. Em se tratando de materiais, é possível medir, com precisão, em laboratório, por intermédio de fórmula matemática, a resiliência dos mesmos, sendo que, esta se dá de acordo com o tipo de material, ou seja, materiais diferentes apresentam diferentes módulos de resiliência.

Há aproximadamente trinta anos, o conceito de resiliência tem sido pesquisado na área psicológica, não havendo, contudo, a mesma precisão apresentada pela Física quanto a sua definição devido à complexidade dos aspectos relacionados ao ser humano, tendo em vista a diversidade dos mesmos. Nesta área, o termo costumava ser compreendido como invencibilidade ou invulnerabilidade. Segundo Werner & Smith:

(...) o psiquiatra infantil E. J. Anthony introduziu o termo invulnerabilidade na literatura da Psicopatologia do desenvolvimento para descrever crianças que, apesar de prolongados períodos de adversidades e estresse psicológico, apresentam saúde psicológica emocional e alta competência.

(Werner & Smith, 1992, P. 04).

Atualmente, é discutível a ideia de que a criança seja completamente isenta a qualquer forma de desajuste emocional e/ou social. Na concepção de Rutter (1993), a palavra invulnerabilidade dá margens para o entendimento de resistência total ao estresse, transmitindo a ideia de que o ser humano possua capacidade ilimitada para suportar o sofrimento. Menciona, ainda, que o referido termo passa apenas a ideia, no entanto, pesquisas sobre o caso têm demonstrado que a resistência humana ou resistência ao estresse é relativa, pois o grau da mesma oscila em conformidade com as circunstâncias, ao contrário do que foi sugerido por Werner e Smith (1992), pois envolve aspectos constitucionais e ambientais.

Assim, conforme afirmam Zimmerman e Arunkumar (1994, p. 04), resiliência consiste em “habilidade de superar adversidades, o que não significa que o indivíduo saia da crise ileso, como implica o termo invulnerabilidade”. Uma das concepções de Martineau (1999, p. 73), a respeito desse assunto ilustra que o discurso experiencial pode ser interpretado a partir de vivências de adultos com vistas na forma com que cada um reage à influência dos inúmeros agentes externos, ou seja, a resiliência passa pelas diversas maneiras com que cada ser interpreta suas experiências.

A referida autora cita os estudos longitudinais de Werner e Smith (1986, 1993 e 1982, 1989, 1992, respectivamente), mencionando que tais estudos não se propunham especificamente à observação da resiliência, pois focavam, inicialmente, os efeitos cumulativos da pobreza, do estresse perinatal e o trato familiar insuficiente no desenvolvimento emocional, social e físico da criança.

Grotberg, (1995, p. 07) aponta “Resiliência é uma capacidade universal que permite que uma pessoa, grupo ou comunidade previna, minimize ou supere os efeitos nocivos das adversidades”. Estudiosos do assunto interpretam o desenvolvimento humano segundo as diferentes formas de adaptação do indivíduo desde a infância até a fase adulta, associando o ajustamento como “adaptações prévias” responsáveis pela sensação de proteção ou desamparo (...), segundo ilustram Hawley e Dehann (1996).

2 – A VISÃO DE MUNDO SEGUNDO FREUD

Segundo Comte, citado por Wladimir Safatler (2010, p. 15), “Freud compreende a vida social a partir do desenvolvimento progressivo de três grandes visões do mundo (weltanschauung): a animista, a religiosa e a científica. Cada uma equivaleria, de uma maneira muito aproximativa, a momentos de desenvolvimento subjetivo”.

Segundo o autor supracitado, tais visões:

(...) se organizam como correspondentes de um processo de maturação subjetiva que vai em direção ao narcisismo primário, com seus processos projetivos; posteriormente, à experiência do desamparo, com a internalização da Lei social através da constituição de uma instância moral de observação (o supereu) internalizada pelos sujeitos; por fim, ao esboço de realização de expectativas emancipatórias.

(WLADIMIR SAFATLER, 2010, p. 15).

Diante do exposto, pode-se compreender que a visão de mundo passa por esses três estágios, relacionando-se com o processo de maturação do indivíduo. Sendo que, o narcisismo, em consonância com as ideias apresentadas por Safatler (2010, p. 18), “é acima de tudo, modo de organização da experiência a partir da referência à imagem de si”.

Ampliando esse conceito para o foco religioso, o autor (p. 18) afirma que o sentimento de desamparo é associado por psicanalistas à angústia, “cuja fonte encontra-se nos desdobramentos do estado de prematuração do bebê ao nascer (com sua incompletude funcional e sua insuficiência motora)”. Esclarece, assim, que a necessidade de cuidados especiais inerentes ao recém nascido gera um vínculo de dependência com os pais em função de sua “situação de desamparo” (p. 19).

Neste contexto, atenta para a necessidade de uma visão holística sobre “o problema freudiano do desamparo”, apontando que, neste encontra-se “um verdadeiro diagnóstico social ligado a certo desencantamento do mundo” (Safatler, 2010, p. 19), oriunda de uma divergência do pensamento animista segundo o qual, o homem é parte integrante da natureza e as tendências ético-religiosas que rompem com tal crença, desencadeando, dessa forma, o desamparo.

Enquanto a visão de mundo embasada no animismo se relaciona à crença no potencial cognitivo, cujo poder seria capaz de grandes feitos em sua atuação na natureza, a visão religiosa, provoca uma situação de conflito com essa convicção, a partir da percepção do indivíduo de que não é totalmente ileso em suas relações, gerando o desamparo, diante do qual, refugia-se na religião, que o faz enxergar certas questões como a morte, por exemplo, despertando a sensação de impotência.

Tais circunstâncias remetem-nos tanto à formação familiar e cultural quanto à dependência de alguém que possa protegê-lo e ampará-lo. Assim, o indivíduo é capaz de anular sua posição existencial em função de um suposto líder protetor.

Esses reflexos incorporados às questões sociais influenciam na ideia de finitude e diminuição do “eu”, originando sentimentos recalcados e atitudes de submissão, comprometendo, dessa forma, o processo emancipatório. Desse modo, na concepção freudiana, ocorre o bloqueio, uma vez que, o homem moderno ao ser influenciado pelos conflitos e vínculos sócio-culturais, limita sua visão de mundo, daí, a Teoria da Modernidade Bloqueada.

2.1 – Modernidade Bloqueada e resiliência político-social

Na visão de Freud, é possível definir um diagnóstico social a partir da socialização dos cidadãos modernos, relacionando-o à maneira como os mesmos são impactados pela situação social do momento, destacando a família como principal fator, conforme ilustra Safatler:

Desta forma, tudo se passa como se Freud procurasse pensar o impacto dessa situação social de época na vida psíquica dos sujeitos modernos. A principal delas diz respeito à maneira com que tais sujeitos serão socializados no interior da família. Eles entram no núcleo familiar como quem procura, principalmente, um modo de defesa contra o sofrimento psíquico advindo do sentimento de desamparo.

(SAFATLER, 2010, p. 20).

Com base nesta concepção o autor associa a autoridade familiar à “autoridade que suporta outros vínculos sociais, como os vínculos religiosos ou políticos” (p. 20). Para ilustrar tal ideia cita a afirmação de Freud acerca do caso:

A exploração psicanalítica dos indivíduos ensina de maneira enfática que o deus de cada homem é formado a partir do pai, que a relação pessoal a Deus depende da sua relação ao pai carnal, que ela oscila e se transforma a partir desta última, e que Deus, no fundo, não é outra coisa que um pai elevado.

(SAFATLER, 2010, p. 21).

Tal princípio permite interpretar o “comportamento social das massas” com base nas relações oriundas do ambiente familiar, mais precisamente na dependência e submissão oriundas do núcleo familiar, no entanto, vale lembrar que “(...) todo vínculo à autoridade é baseado sob alguma forma de demanda de amor e reconhecimento; nunca é simplesmente o resultado de alguma coerção” (Safatler, 2010, p. 23).

Entende-se, assim, que a tolerância do cidadão à coerção social e as imposições de certas instâncias superiores não se justificam pelo sentimento de dependência e desamparo, logo, não seria viável atribuir adjetivo de resiliente ao indivíduo que suporta tais imposições. Conforme cita Safatler (2010):

Há nas massas humanas uma forte necessidade de uma autoridade que se possa admirar (...). A psicologia do indivíduo nos ensinou de onde vem tal necessidade das massas. Trata-se da nostalgia do pai.

(SAFATLER, 2010, p. 21).

Segundo definição de Martineau (1999, p. 103), “resiliência tem diferentes formas entre diferentes indivíduos em diferentes contextos (...)”. Muitos estudos sobre o assunto têm sido voltados para as camadas sociais menos favorecidas; inúmeras pesquisas realizadas sobre a resiliência atribuem-na à pobreza sob o prisma de inquietação por supostas ameaças à classe dominante.

Tal visão merece especial atenção, visando à prevenção da não utilização dessa temática como justificativa utilizada por políticas públicas que objetivam reforçar a desigualdade social no país aproveitando-se da falsa ideia de que as mesmas são oriundas do fracasso das famílias desfavorecidas, ao invés de desenvolver políticas destinadas ao crescimento econômico e à distribuição de renda de forma justa e adequada.

Em muitas situações, observam-se a patologização da pobreza atribuindo às famílias de baixa renda sentimento de conformismo com o caos social em que se encontram, numa análise que coloca a culpa na própria vítima do sistema excludente que a lesa de seus direitos constituídos na legislação vigente, tais como atendimento médico e educação de qualidade; segurança, lazer, dentre outros.

Em outros contextos históricos, percebe-se a legitimação da prática de segregação racial como o fascismo e o nazismo como necessidade do opressor em manifestar autoridade.

3 – PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DE PESSOAS RESILIENTES

Nos dias atuais em que vivemos em constante correria, devido às exigências do mundo moderno e da própria sociedade excludente da qual fazemos parte, o sucesso dos indivíduos, seja em âmbito pessoal ou profissional, está intrinsecamente associado às habilidades da inteligência emocional desenvolvidas a fim de suportar, com eficácia, os momentos difíceis. Tais habilidades incluem o enfrentamento de crises e a resistência a situações complexas do cotidiano.

Uma das principais características desse indivíduo é a tolerância a mudanças, afinal o fenômeno globalizante e a evolução tecnológica passam por sucessivas e rápidas transformações, cujas descobertas nem todas as pessoas conseguem acompanhar em tempo hábil, conforme afirma Demo:

(...) o que fica da experiência da vida é o que se reconstrói com mão própria em contexto social, não o que se acumula de maneira reprodutiva; sobretudo diante da velocidade com que o conhecimento se inova e também envelhece; é improdutivo pretender acumulá-lo, porque isso só o faria envelhecer mais rapidamente; sua energia mais forte está, por isso, no saber pensar para melhor intervir, num processo permanente de renovação.

(Demo, 1997, p. 73).

As pessoas podem optar por ser resilientes ou automáticas, sendo que as consequências dessa decisão implicarão em sua qualidade de vida e no alcance ou não das metas traçadas, dos objetivos e dos próprios sonhos, afinal, o resultado de nossas ações depende da inteligência das atitudes desenvolvidas.

O sistema capitalista não considera o caráter humanista e sua característica emancipadora, assim, propaga a ideia de que o mundo é imutável e as relações humanas se resumem numa repetição do que já existe, oprimindo o cidadão, de modo camuflado, através da negação do que lhe é possível.

Por outro lado, requer dos indivíduos novos posicionamentos mediante situações adversas e práticas inovadoras que favoreçam a produtividade, daí a necessidade constante dos mesmos em analisar e rever as habilidades e competências fundamentais, a fim de encontrar seu espaço no meio social, conscientes de seus direitos humanos e da importância de se colocar como parte integrante do mundo.

O alarmante índice do exército de reserva, em virtude da concorrência e da exigência de qualidade e dinamismo neste mundo globalizado, faz com que a marginalidade torne-se cada vez maior. Assim, o cidadão necessita integrar-se às tradições sócio-culturais locais e ao mesmo tempo, ampliar seus horizontes em conivência com o desenvolvimento tecnológico. Na opinião de Zabala:

As razões que justificam a resposta à pergunta de quais serão as necessidades de todo tipo que terão nossos alunos quando forem adultos, ou seja, em pleno século XXI, e a avaliação das capacidades que se terá de potencializar para que possam superar os problemas e os empecilhos que surgirão em todos os campos (pessoal, social e profissional) não apenas estão sujeitos a uma análise prospectiva, como principalmente à consideração do papel que deverão ter na sociedade como membros ativos e co-partícipes em sua configuração.

(Zabala, 1998, p. 29).

As tendências da sociedade da informação denotam a preferência das empresas por mão-de-obra qualificada e funcionários com maior nível de escolaridade, no entanto, não se pode negar que o mercado de trabalho prefere mão-de-obra barata e menos qualificada, dessa forma, as pessoas que não tiveram oportunidade de se especializar acabam sendo exploradas.

Algumas delas por acreditarem em sua incapacidade para conquistar algo melhor, se deixam explorar. Outras se revoltam com a situação e insatisfeitas, aderem ao mundo do crime, passando a viver às margens da sociedade.

Vale ressaltar que existem outros fatores geradores da exclusão e que nem todos os casos de marginalidade são justificados por essas razões, contudo, é notório que a iniciativa e a força de vontade do indivíduo contribuem, de forma significativa, para legitimar a desigualdade social ou transformá-la.

Evidentemente, as habilidades cognitivas se desenvolvem de acordo com as peculiaridades de cada pessoa. Desse modo, alguns assimilam as informações com maior precisão e rapidez, enquanto outros apresentam maiores dificuldades para reter e acomodar as mesmas informações, demandando maior espaço de tempo.

Outro equívoco cometido até mesmo em ambiente escolar é o fato de associar a falta de êxito nos estudos ao baixo QI (quociente de inteligência), à falta de poder aquisitivo e a condição social, contudo, diversas pesquisas revelam que um ser humano só pode ser considerado incapaz de construir seu conhecimento por deficiências orgânicas.

Sendo assim, o aluno mal sucedido nos estudos não será, necessariamente, aquele de origem humilde, pois não há relação de inteligência com condições sócio-econômicas. Tal concepção pode funcionar como elemento castrador das habilidades cognitivas e sociais.

O indivíduo resiliente terá condições de superar esse rótulo, ao passo em que o não-resiliente aceitará a condição de impotência que lhe foi imposta. Segundo Silva:

O sucesso de um indivíduo (...) cada dia mais estará relacionado com sua capacidade de visualizar as tendências tecnológicas, em um horizonte de tempo mais profundo, para que, em tempo hábil, possa melhor se planejar, minimizando os espaços e aproveitando melhor as oportunidades emergentes.

(SILVA, 1995, p. 5).

Elevado número de brasileiros é lesado em seus direitos, vivendo sem o mínimo de condições adequadas para uma vida digna, saudável e com equalização de oportunidades que lhe permitam conquistar o que já é seu por direito.

Não se pode conceber que sua fala seja podada, afinal, a oratória tem grande representatividade no cenário mundial, pois globalização sugere contextualização, integração, dinamismo. O que se vê, no entanto, é a falta de contextualização, sendo que, este termo está em voga neste século em que o principal não é apenas o foco, mas a visão global de mundo e de vida para que se possa entender as coisas e as pessoas. Vale ressaltar que as condições atuais apontam para o reconhecimento dos valores do espírito, pois consideram as inteligências múltiplas e priorizam a inteligência emocional.

Diante disso, pode-se concluir que em nossos dias não há mais espaço para os “mandonismos” políticos do presente. O cidadão precisa se impor como sujeito de sua história e construí-la de modo que seja um ator social ao invés de apenas coadjuvante.

Enquanto não houver mudanças neste sentido, o cidadão brasileiro menos favorecido continuará vivendo à margem da sociedade, sobrevivendo do subemprego, excluído da sociedade que exige formação e qualificação profissional, mas em contrapartida, explora os indivíduos não contemplados com um diploma, prevalecendo-se dessa situação para se utilizar de sua força de trabalho mal remunerada e alegando a importância da resiliência na vida dessas pessoas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A resiliência é um termo muito comentado no momento, sendo utilizada há mais tempo pela Física, área que a conceitua como capacidade máxima do material para suportar a deformação sem sofrer alteração permanente. A resiliência de tais materiais pode ser medida com precisão através de fórmula matemática, em laboratórios, observando-se que materiais diferentes apresentam diferentes reações nesse sentido.

Em Psicologia, não há a mesma precisão, pois a complexidade humana não a permite. Alguns estudiosos dessa área a concebem como sinônimo de invencibilidade ou invulnerabilidade.

Outros, no entanto, discordam dessa concepção, pois alegam que a mesma sugere que a criança seja completamente isenta a qualquer forma de desajuste emocional e/ou social, fato discutível para alguns pesquisadores do caso, pois o termo invulnerabilidade quer dizer resistência total, supondo que a capacidade humana para suportar o sofrimento seja ilimitada, no entanto, na prática, não é o que ocorre, afinal, essa resistência é relativa e varia de acordo com as circunstâncias por envolver circunstâncias constitucionais e ambientais.

Além disso, segundo Zimmerman e Arunkumar (1994, p. 04), ser resiliente é possuir “habilidade de superar adversidades, o que não significa que o indivíduo saia da crise ileso, como implica o termo invulnerabilidade”.

É válido lembrar que essa capacidade pode ser mais acentuada em algumas pessoas do que em outras, pois associa-se às peculiaridades dos indivíduos.

Assim, relacionando o referido assunto à teoria da Modernidade Bloqueada observa-se a possibilidade da resiliência social manter íntima relação com a mesma, já que na visão de Freud, a autoridade predominante nas relações sociais vincula-se a três importantes aspectos do desenvolvimento humano que nortearão sua visão de mundo, a saber, visão animista, religiosa e científica.

Entende-se, assim, que a visão de mundo parte, inicialmente, da referência que o indivíduo tem de dele próprio. Em seguida, essa experiência se mescla ao foco religioso, que por sua vez, gera conflitos quanto à estabilidade originada da relação homem/natureza, ocasionando o sentimento de desamparo. Considerando que o ser humano ao sentir-se desprotegido tende a buscar apoio na figura que lhe transmite segurança, subentende-se que em âmbito social a imagem do pai enquanto figura protetora e, por isso, dominador da situação, é substituída pelo líder religioso e/ou político que apresente tais características.

Assim, se explicaria a submissão e a dificuldade em alcançar a emancipação. Tais fatos, porém, são confundidos com tolerância exacerbada e aproveitados por políticas descomprometidas com a qualidade de vida da população e os direitos humanos assegurados na legislação do país.

Embora seja possível ocorrer mudanças em qualquer sociedade, ao analisar o cenário sociopolítico e econômico do presente, associando-o à teoria freudiana da modernidade bloqueada, subentende-se que, as mudanças ocorridas na estrutura familiar, nas diferentes posturas adotadas pela figura de pai, fato que interfere na aquisição dos valores incorporados pelos indivíduos, principalmente, no que tange a autoridade e o sentimento de desamparo, certamente, influenciam as questões políticas, econômicas e sociais, contudo, há também que se considerar o aspecto da individualidade, o que nos remete à ideia de que o bloqueio passa pela personalidade de cada indivíduo, pela forma como cada um escolhe manifestar sua existência.

Isso implica a exposição ou omissão de opiniões e atitudes de aceitação ou questionamento frente às situações de adversidades e desrespeito aos direitos humanos nesta excludente e concorrida sociedade da informação e do conhecimento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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http://www.rhportal.com.br/artigos/wmprint.php?idc_cad=53d45uben

Acessado em 11/11/2010



[1] Aluna do Curso de Especialização em Psicologia e Psicanálise da UFES.

[2] Pedagoga da SEME-Itapemirim, tutora presencial do curso de Especialização em Psicologia e Psicanálise da NEAAD/UFES.

O Problema Social da Drogadição Sob a Ótica Psicanalítica

Charlene Santos Cardoso
Universidade Federal do Espirito Santo - UFES
Artigo Cientifico da Disciplina: Freud Como Teorico da Modernidade Bloqueada
Professor: Vladimir Safatle.



RESUMO

A sociedade contemporânea em que vivemos, precisamente o século XXI, é marcada por mudanças. Mudanças de paradigmas, mudanças culturais, sócio-econômicas e de valores, que implicam necessariamente em uma re-adaptação do indivíduo em seu meio. Frente a tantas mudanças, que não deixam de interferir no afeto e no comportamento, o indivíduo em sua unicidade e a própria coletividade têm sentido os efeitos desses impactos.

Ao contrário do que muitos pensam a Dependência Química não é uma causa dos males atuais da sociedade, mas, um dos efeitos do caos em que emerge esta mesma sociedade. Esta falta de identidade contemporânea tem trazido ao indivíduo uma necessidade de se alienar de toda esta angústia conseqüente. Por outro lado, paradoxalmente, quando o indivíduo busca as drogas, este tem a uma possibilidade de encontrar a identidade perdida por meio da identificação grupal.

Diante de todos os efeitos que a sociedade tem presenciado frente a este processo mutante contemporâneo, é sobre a Dependência Química enquanto efeito que vamos discutir neste artigo que tem como objetivo procurar compreender o problema social da drogadição bem como a visão psicanalítica de Freud diante desse problema social.

O artigo tem como base de investigação uma pesquisa bibliográfica.

Palavras-chave: Problema social, adicção e psicanálise.

ABSTRACT

Contemporary society we live in, precisely twenty-first century is marked by change. Paradigm shifts, cultural, and socio-economic values, which necessarily imply a re-adjustment of the individual in their midst. Faced with so many changes, which do not cease to interfere with the affection and behavior, the individual in their uniqueness and their own community have felt the effects of these impacts.

Contrary to what many think the Addiction is not a cause of present evils of society, but one effect of the chaos that emerges from this same company. This lack of contemporary identity has brought to an individual need to dispose of all this anguish consequent. On the other hand, paradoxically, when the individual seeking drugs, he has a chance of finding the lost identity by means of group identification.

With all the effects that society has seen the face of this contemporary process of mutation is about the Chemical Dependency effect as we discuss in this article that aims to seek to understand the social problem of drug addiction and the psychoanalytic view of Freud on this issue social.

The article is based on a literature research.

Keywords: social problem, addiction and psychoanalysis.



O Problema Social da Drogadição Sob a Ótica Psicanalítica

Desde os primórdios de sua história, o homem tem mostrado curiosidade ou desejo por realizar experiências com substâncias psicoativas. Em todas as épocas, os homens valeram-se de produtos psicoativos para modificar sua consciência, explorar seu ego de maneira mais profunda e descobrir as fontes onde acreditavam residir a felicidade verdadeira.

A história do homem, em seus mitos e lendas, está repleta de experiências de revolta contra as contingências que limitam seu desejo de transcendência, em que ele busca a imortalidade, o prazer e o saber através do uso de drogas.

A posição da sociedade diante do uso de substâncias psicoativas, a proibição ou a legalidade de seus diferentes tipos, as regras e objetivos para sua utilização, assim como a finalidade e o significado de seu consumo variam entre as culturas e, historicamente, dentro de uma mesma cultura. Enquanto uma sociedade considera as drogas um mal a ser eliminado, outra a toma como um bem, um meio privilegiado de expressão de sensibilidade e sabedoria.

De acordo com Bucher, 1988 pode-se falar de três sentidos básicos que adquiriu o consumo de drogas. Os dois primeiros sentidos referem-se à droga como um instrumento que permite transcender a transitoriedade e a angústia que esta acarreta, bem como possibilitar o contato com forças divinas e espirituais, representando um meio do qual os indivíduos se servem para tentar preencher uma falta fundamental e alargar seus limites existenciais. A angústia sentida pelo homem diante da questão da morte, as experiências religiosas e, sobretudo, místicas com drogas documentam esses dois sentidos, incluindo, portanto, os denominados usos ritualísticos. A droga, aqui, está inserida em um contexto cultural e estruturante e refere-se a uma intencionalidade ou a projetos individuais ou sociais, cujas normas são passadas de geração a geração. Bucher, 1988 diz ainda que recorrer às drogas ainda permite um terceiro sentido, o da busca de prazer, que é o que, obviamente, predomina na cultura ocidental contemporânea. Dissociado de sua finalidade cultural, o consumo atual da droga reflete a procura de prazer que se impõe como um fim em si, evidenciando não mais um caráter social construtivo, pois já não é o caso apenas de uma recusa social, mas muito mais de um sentir-se incapaz de se situar tanto no âmbito individual quanto social.

Estando a constituição psíquica do ser humano individual intimamente ligada à introjeção de valores culturais em vigência na sociedade em que vive, o uso da droga na sociedade contemporânea não está dissociado dos aspectos culturais que essa sociedade privilegia. Relações competitivas e individualistas, imediatismo, a obtenção do prazer fácil estimulam, no indivíduo, com particular violência, o desejo da obtenção imediata de um prazer intenso, solitário, muito mais restrito ao corpo, sem expressões culturais verdadeiras, limitando todos os possíveis investimentos dirigidos ao outro, quando não os extinguindo. Na atualidade, o uso de substâncias psicoativas encontra cada vez menos espaço para o seu uso ritualizado, de experiência transcendente, provavelmente em unção de nossa organização social estar baseada em um sistema que, em última instância, aliena o sujeito de si mesmo. Dessa forma, abre-se espaço para um uso cada vez mais abusivo e desintegrador.

A antiga comunidade transformou-se, no caso extremo do capitalismo, em um

mecanismo social desumanizado que, embora torne possível a individualização, é hostil e estranho ao indivíduo. Portanto, embora o problema da Drogadição e do uso abusivo de drogas compreenda uma dimensão patológica e clássica, é inviável resumir sua explicação a essa dimensão. Se é tentador aos psiquiatras “patologizar” tais indivíduos, classificando-os seja como “perversos”, seja como “desequilibrados”, nada mais equivocado do que ater-se a um plano puramente descritivo para compreender o fenômeno da adicção, cuja determinação dos fatores desencadeantes é quase sempre inacessível à observação direta. Para se compreender o fenômeno é necessário tentar ver, por trás das aparências caracterológicas da drogadição, os meandros da história do indivíduo da qual elas são o sintoma ou o conflito social da qual são o anúncio. (Marx, 1991).

A sociedade não apenas delimita o espaço em que o uso de drogas não é patológico (como no caso de usos rituais presentes em determinadas culturas), como também pode impulsionar, de diferentes maneiras (mesmo que de forma inconsciente no sentido descritivo) indivíduos com certas características de personalidade a procurar a droga.

Quanto à idéia da primazia do imediatismo na circunscrição da sociedade atual, observa-se que, além da necessidade de busca incessante do prazer, é proibido às pessoas terem sofrimentos ou angústias – existe um remédio específico para cada dor; esta deve ser suprimida e evitada ao máximo. Uma característica típica dos indivíduos dependentes de drogas refere-se a essa intolerância à espera, na medida em que as suas necessidades devem ser satisfeitas imediatamente. Quando isso não acontece, os adictos reagem a essa frustração como se fosse um traumatismo e utilizam a droga como fuga ou um falso remédio para suas angústias. Considerando que essa é uma característica fundamental da sociedade nos dias de hoje, poderia-se pensar se os adictos não encontraram uma forma de atender às demandas provenientes da própria sociedade. Assim, o uso cada vez mais crescente de drogas estaria evidenciando um sintoma social.

Kalina 1999, sublinha o aspecto depressivo na personalidade drogadictiva; a focaliza, nesta patologia, a importância da fuga à dor e a tentativa de escapar à depressão e ao que é sentido como persecutório. De acordo com essa perspectiva, o drogadicto dificilmente poderá tolerar o ingresso na posição depressiva2, uma vez que ele sente-se incapaz de aceitar as frustrações sem que essa aceitação acarrete a perda do objeto bom; com o intuito de evitar cair nessa posição, o toxicômano utiliza-se da droga. A droga, mais uma vez torna-se “necessária”, visto que ela é um objeto idealizado pelo toxicômano e sua ingestão é feita pelo mesmo com a ilusão de eliminar a ansiedade paranóide produzida pela ameaça constante do núcleo psicótico subjacente. Ela afirma que a eliminação dessa ansiedade equivale à superação da fragilidade do ego e, por fim, à descoberta de um caminho quimicamente efetivo para evitar a desintegração psicótica. A organização psíquica dos indivíduos dependentes de drogas compreende, além dessas características, outros elementos de extrema importância para o seu entendimento.

A paixão tóxica, constitutiva dessa patologia, consiste em um tipo de amor muito específico: um amor caracterizado por uma economia psíquica essencialmente narcísica. A busca imperiosa pela droga é, em si, extremamente narcísica; o investimento libidinal é retirado do mundo exterior e dirigido para o próprio indivíduo toxicômano através da droga – a droga é o seu objeto de amor. A libido, convertida em narcisista, não encontra, então, um caminho de regresso para os objetos (no caso da drogadição, para outros objetos que não a droga) e este obstáculo à sua mobilidade é o que passa a ser patológico. (Kalina 1999)

Esse caminho de retorno ao estado primitivo do narcisismo trata-se de uma

verdadeira regressão. Essa regressão íntima e de comportamento altera completamente as relações do toxicômano com o mundo e, excetuando-se impulsos agressivos.

A posição depressiva, postulada por Kaline, tem início quando a criança reconhece sua mãe como objeto total. Relaciona-se a uma constelação de relações de objeto e ansiedades; caracterizada pela experiência da criança de atacar a mãe ambivalentemente amada e de perdê-la como objeto externo e interno. Essa experiência origina sofrimento, culpa e sentimentos de perda.o que predomina na vida dos toxicômanos é principalmente a inibição, a recusa a se conhecer e a fuga graças às fantasias de poder.

Segundo Oliveinstein (1988) afirma que uma das dimensões da utilização da droga é o desejo de refutar a existência tal como é vivida. Esses elementos recorrem à imagem de um desejo de morte e não mais a de um desejo de prazer apenas.

Esse desejo de morte liga-se, intimamente, mas de forma ainda não totalmente

explorada pela psicanálise na patologia em questão, à última teoria pulsional de Freud.

Em Totem e Tabu, de 1913, Freud, considera o homem como um animal de horda, dado que o grupo humano, nas suas origens não passaria de uma massa aglutinada em torno de um macho dominante, de um pai despótico e onipotente, que se apropriava de todas as mulheres e perseguia os filhos quando estes cresciam. Certo dia, os irmãos, revoltaram-se, matando e comendo o pai, transitando-se, a partir deste parricídio, da horda biológica e instintiva, para a comunidade, diferenciada e orgânica. Num terceiro tempo, terá vindo o remorso, o sentimento de culpabilidade, gerando-se tanto o tabu (por exemplo, a proibição de tomar mulheres dentro do próprio grupo) como o totem, o culto do antepassado assassinado que, assim, se diviniza e idealiza. E nesse complexo de Édipo estão os começos da religião, da moral, da sociedade e da arte. Neste sentido, o príncipe aparece como substituto do pai.

O líder na figura de pai e seus seguidores, enquanto filhos tornam a luta política uma luta geracional. Na ambivalência, as mudanças sociais se tornam recorrências e as relações sociais só tem sentido pelas necessidades psicológicas que preenchem. A crítica social é desvalorizada, na medida em que é vista como manifestação da ambivalência geral das emoções. A desconfiança dos governados ante o poder não se dá por uma visão nacional de suas vitórias e fracassos, mas como expressão de sentimentos hostis.

Freud (1938), afirma que: “Após longa vacilação e oscilação temos resolvido aceitar somente duas pulsões básicas: Eros e pulsão de destruição. A meta da primeira [de Eros] é produzir unidades cada vez maiores e, assim, conservá-las, ou seja, uma ligação; a meta da outra é, ao contrário, dissolver nexos e, assim, destruir as coisas do mundo.

Portanto, a ação de ambas as pulsões está além dos limites individuais, exteriorizando-se na cultura por meio de sua contraposição entre Eros e pulsão de destruição.

Freud, em Além do princípio do prazer (1920), diz ainda que, as exteriorizações de uma compulsão de repetição – como a encontrada no comportamento do adicto – mostra em alto grau um caráter pulsional e onde se encontram em oposição ao princípio do prazer. Essa compulsão de repetição aparece como mais originária, mais elementar, mais pulsional que o princípio de prazer que ela destrona. A tarefa desta compulsão de repetição seria, então, a de dominar ou ligar a excitação a fim de conduzi-la depois a sua tramitação (à aplicação do princípio do prazer.

Conclusão

A dinâmica psíquica de drogaditos é desse modo, algo complexo e não redutível a um determinado aspecto. O encontro da droga com um indivíduo não é suficiente para “produzir” o fenômeno da toxicomania. É necessário o encontro entre um indivíduo que possui um funcionamento específico de personalidade (uma estrutura psíquica com certas características), um momento histórico e social e uma substância capaz de alterar esse funcionamento, atuando de forma a minimizar o sofrimento sentido por este indivíduo ou trazê-lo a um estado de satisfações nunca antes concebido.

Portanto, a identificação dos fatores que contribuem para explicar a psicodinâmica do adicto certamente ultrapassará o nível individual, podendo-nos levar a concordar com Freud quando ele afirma que o mal-estar está na civilização.


Referencias Bibliográficas

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